Minuta de pedido de asilo na Argentina levanta a suspeita de fuga de Jair Bolsonaro
Jair Bolsonaro tem até a noite desta sexta-feira (22) para explicar o descumprimento de medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal. Na quarta-feira (20), a Polícia Federal indiciou o ex-presidente e o filho deputado, Eduardo Bolsonaro, por coação para interferir no julgamento da tentativa de golpe de Estado.
O pastor Silas Malafaia foi alvo de busca e apreensão, em consequência de mensagens dele para Jair Bolsonaro encontradas num celular do ex-presidente. O aparelho também continha a minuta de um pedido de asilo na Argentina e levantou suspeitas de que Bolsonaro pretendia fugir do Brasil.
As mensagens e áudios encontrados nos dois celulares do ex-presidente comprovam, segundo a Polícia Federal, que Jair Bolsonaro descumpriu medidas impostas pela Justiça.
Segundo o relatório da PF, mesmo proibido pelo Supremo Tribunal Federal, Bolsonaro manteve a produção e a divulgação de mensagens para as redes sociais. E também teve contato com outros réus na ação da trama golpista.
A PF descobriu que, em 9 de fevereiro de 2024, por exemplo, o general da reserva Walter Souza Braga Netto, ex-ministro de Bolsonaro, falou com o ex-presidente por mensagem de texto. Um dia antes, o ministro Alexandre de Moraes havia determinado que os investigados pela tentativa de golpe de Estado não podiam manter contatos entre si.
A mensagem a Bolsonaro dizia:
“Estou com este número pré-pago para qualquer emergência. Não tem zap. Somente face time. Abs Braga Netto.”
A Polícia Federal também encontrou documentos que, segundo os investigadores, mostram que Bolsonaro planejou fugir do Brasil e pedir asilo político na Argentina. A PF descobriu que o arquivo foi salvo no celular do ex-presidente também em fevereiro de 2024, dois dias depois da operação que apreendeu o passaporte dele.
O documento de 33 páginas, sem data e sem assinatura, era endereçado ao presidente argentino Javier Milei, aliado de primeira hora do ex-presidente. Nele, Bolsonaro se diz perseguido político:
“Solicito a Vossa Excelência asilo político na República da Argentina, em regime de urgência, por estar na iminência de ter minha prisão decretada, de forma injusta, ilegal, arbitrária e inconstitucional.”
Bolsonaro salvou pedido de asilo na Argentina dois dias após ter passaporte apreendido em 2024, diz PF
Reprodução/TV Globo
Segundo a PF, o teor revela que o réu, desde a deflagração da operação Tempus Veritatis, planejou atos para fugir do país, com o objetivo de impedir a aplicação da lei penal.
Os metadados do documento, que trazem as informações sobre o arquivo, mostram que o pedido de asilo foi criado por um usuário chamado Fernanda Bolsonaro.
A PF afirma que é possível que o usuário em questão esteja vinculado a Fernanda Antunes Figueira Bolsonaro, nora do ex-presidente e esposa do senador Flávio Bolsonaro.
Diante dessa descoberta, o ministro Alexandre de Moraes deu 48 horas para os advogados de Bolsonaro explicarem a suposta tentativa de fuga. Esse prazo termina na noite desta sexta-feira (22).
Também em fevereiro de 2025, Bolsonaro ficou por dois dias na Embaixada da Hungria, em Brasília. Na época, a defesa do ex-presidente disse que ele foi convidado a se hospedar na embaixada, onde conversou com autoridades húngaras sobre o cenário político dos dois países.
Em outro trecho do relatório, a PF afirmou que Bolsonaro agiu de forma deliberada para descumprir as medidas cautelares, de forma a subverter as limitações judiciais impostas por vias alternativas, mantendo-se o mesmo modus operandi da milícia digital: difusão em alto volume, por multicanais, de forma rápida, contínua, utilizando pessoas com posição de autoridade perante o público-alvo, para dar uma falsa credibilidade às narrativas propagadas.
Segundo o relatório da PF, o ex-presidente atuou em conjunto com o filho Eduardo e o pastor Silas Malafaia, alvo de operação na noite desta quarta-feira (20).
Em 25 de julho, segundo a Polícia, o pastor enviou uma mensagem a Bolsonaro orientando o ex-presidente a enviar vídeos em listas de transmissão no WhatsApp, uma forma de espalhar o conteúdo mais rapidamente. Ele diz: "Atenção! Dispara esse vídeo às 12h".
Três dias depois, segundo a PF: "Malafaia, atuando com adesão subjetiva ao intento criminoso, instiga Jair Bolsonaro a descumprir as medidas cautelares até então vigentes, solicitando de forma expressa que Bolsonaro encaminhe “na sua lista de transmissão” o vídeo enviado pelo pastor no dia anterior, mantendo a ideia: 'Você é a voz!'”.
A Polícia Federal afirmou que o dolo na conduta dos investigados restou evidenciado a partir do conjunto de ações previamente ajustadas e deliberadas, construídas de modo consistente e gradual, com a finalidade de alcançar interesses ilícitos, em clara tentativa de coerção de autoridades públicas e cerceamento do livre exercício dos poderes constituídos.